Paula Trindade é agraciada com medalha Honra ao Mérito

Homenagem foi proposta pela vereadora Suely Morgado

Compartilhe!

5 curtiram

A ex-promotora da Infância e da Juventude de Santos, Paula Trindade, recebeu a Medalha de Honra ao Mérito Brás Cubas em solenidade marcada na noite da última sexta-feira, 14/03/08 na Sala Princesa Isabel, da Câmara Municipal. A homenagem foi proposta pela vereadora Suely Morgado (PT), oradora da cerimônia.

A vereadora petista considera que Paula Trindade foi fundamental na aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente em nosso município e teve atuação decisiva na elaboração da legislação que regulamentou o Fundo Municipal e a criação dos primeiros conselhos tutelares. A cobrança sobre a criação de vagas para a educação infantil também é apontada pela vereadora como uma ação significativa da promotora aposentada. 

Assessoria - Gabinete Vereadora Suely Morgado (PT)
Tel.: (13) 3219.5707

PRONUNCIAMENTO DA VEREADORA SUELY MORGADO NA SOLENIDADE DE OUTORGA DA MEDALHA DE HONRA AO MÉRITO BRÁS CUBAS, EM SOLENIDADE REALIZADA EM 14 DE MARÇO DE 2008.

Autoridades presentes, sras. e srs.,

Ainda hoje, passados quase dezoito anos da entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente, encontramos pessoas que se colocam radicalmente contra essa legislação. Isto  porque consideram que ela protege os jovens infratores e lhes garante a impunidade.
 
Geralmente essas críticas partem de pessoas que desconhecem o teor do Estatuto, mas reagem passionalmente após algum delito de grande repercussão que envolva algum adolescente. Nesses momentos, além dos ataques ao ECA, costumam ressurgir as propostas de redução da maioridade penal,  de maior rigor na repressão policial e de endurecimento das leis existentes. 
Atiçada pela imprensa sensacionalista, por setores reacionários e pelos políticos oportunistas, a população menos esclarecida adere facilmente ao discurso simplista do aumento do aparato policial e do confinamento dos adolescentes em conflito com a lei. Acreditam que essas são formas de, rapidamente, solucionar o problema da criminalidade.

Mas de nada adianta construirmos mais e mais estabelecimentos de privação da liberdade, se não forem dadas condições de reabilitação e de reinserção social aos internos. Certamente a solução também não está apenas na maior quantidade de policiais nas ruas se eles não forem preparados adequadamente para agirem como agentes de cidadania e se não tiverem uma remuneração digna, que os afaste da tentação da corrupção e do aliciamento pelo crime organizado.
 
Muito mais do que ações de caráter eminentemente repressivo ou leis draconianas, o bom senso e a experiência nos mostram que o combate à criminalidade entre os jovens exige um conjunto de medidas que estejam direcionadas à geração de emprego e renda; ao acesso à educação, à cultura e ao esporte; à aplicação de penas alternativas; além de uma rede eficaz de atendimento social e de iniciativas de amparo à família.

Portanto, se atualmente é difícil convencer determinados segmentos da população de que o ECA é uma lei moderna, que respeita os direitos humanos e garante o bem-estar de crianças e adolescentes, imaginem como foi difícil defendê-lo no início de sua implantação. A ex-promotora da Infância e da Juventude de Santos, Paula Trindade da Fonseca, sem dúvida alguma, contribuiu expressivamente para que o Estatuto fosse cumprido nesse período.

Sabemos que ela enfrentou muita resistência nessa caminhada e precisou usar de toda a sua autoridade e energia para que os direitos dos nossos jovens, infratores ou não, fossem respeitados. Nascida em Santos, Paula formou-se pela Faculdade de Direito, em 1980. Estagiou com dois eminentes advogados de nossa Cidade, Sérgio Sérvulo da Cunha e Derosse José de Oliveira, até ingressar no Ministério Público do Estado de São Paulo, em 1989. Atuou inicialmente como promotora substituta no litoral norte. Lá, destacou-se na defesa do meio ambiente, notadamente no combate às empreiteiras e loteadores que insistiam em desrespeitar a legislação de proteção ambiental.

Passou posteriormente por outras cidades e retornou a Santos em julho de 1992, quando foi designada para a Promotoria de Justiça da Infância e Juventude. No começo, sentia-se impotente, porque não conseguia dar conta das enormes pilhas de processos que chegavam às suas mãos. Na época, praticamente não existiam recursos humanos e materiais nem programas sociais que permitissem a aplicação das medidas previstas no ECA. Ela inquietava-se com as dificuldades para solucionar os terríveis casos de violência doméstica e de abandono, e com os obstáculos para a recuperação dos jovens infratores.

Logo percebeu que somente os despachos nos processos, cobrando a aplicação do ECA, não eram suficientes. Era preciso arregaçar as mangas e mobilizar a comunidade local para providências efetivas. Decidiu, então, iniciar uma maratona de reuniões com as autoridades municipais e com os representantes das entidades que atendiam crianças e adolescentes.

Havia a necessidade de mais abrigos no município, porque muitas entidades deixaram de prestar esse serviço e passaram a funcionar como creches ou centros de convivência. A Prefeitura mantinha a Casa Pixote, mas não havia, por exemplo, atendimento para crianças recém-nascidas. Depois de muitas reuniões com as entidades de atendimento e interferências junto à Prefeitura, esse quadro começou a mudar, inclusive com a criação, pela administração municipal, da Casa da Vila e da Casa de Acolhimento, destinadas a receber os meninos e meninas que as entidades particulares não podiam atender.

Paralelamente, a promotora encarou a responsabilidade de divulgar o ECA. Proferiu palestras, participou de debates e escreveu artigos para jornais, com o propósito de desmistificar a idéia de que a legislação assegurava superpoderes para os menores de 18 anos, de que bastava a eles dizer “sou de menor” para que subjugassem professores e policiais e saissem ilesos de qualquer ato infracional. 

Foi um período em que Paula Trindade recebia com freqüência, na sala da Promotoria no Fórum, mães desesperadas pela ausência de serviços públicos, pela falta de escola e creches, pela desorientação com o fato dos filhos estarem envolvidos com drogas e com más companhias. Várias vezes, ela teve de oferecer não só orientação jurídica, mas também assistência psicológica, uma palavra de carinho, uma mensagem de esperança.


A então promotora da Infância teve participação preponderante na elaboração da legislação que regulamentou o Fundo Municipal da Criança e do Adolescente, na criação dos Conselhos Tutelares e no processo eleitoral dos primeiros conselheiros tutelares em Santos. Batalhou pela instalação da Delegacia da Infância e da Juventude, requereu à Procuradoria Geral de Justiça para que as requisições de certidão de nascimento pelos conselhos tutelares tivessem isenção de custas nos cartórios de registro civil. Da mesma forma, articulou para que se adotasse a prestação de serviços à comunidade como medida socioeducativa para os adolescentes em conflito com a lei.

Em parceria com a Prefeitura, a Fundação ABRINQ e o grupo “A Tribuna”, ela colaborou para o lançamento da campanha “Seja um Anjo da Guarda”, que arregimentou a comunidade santista para que fosse possível a contratação de adolescentes pelas empresas, a realização de tratamentos de saúde e a recepção de abrigados em casas de família. Desse movimento surgiu a “Associação Comunidade de Mãos Dadas” e o abrigo “Anjo da Guarda”.  

A exploração da mão-de-obra juvenil por entidades que, tradicionalmente, contratavam adolescentes de baixa renda  foi combatida tenazmente por Paula Trindade, apesar da incompreensão inicial de parcela da sociedade. Foi uma longa polêmica, mas, ao final, os contratos de trabalho foram regularizados, de forma a garantir os direitos trabalhistas e previdenciários desses jovens.

Ao representar contra o Poder Público municipal, exigindo que fossem cumpridas as determinações e deliberações do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, Paula lançou-se em mais uma importante contenda, que também resultou vitoriosa. Passados dez anos de vigência do ECA, sua tese foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça sob o entendimento de que a criança e o adolescente são prioridade absoluta e ponto final.    

Incansável, Paula notabilizou-se pela insistência junto ao governo municipal na defesa de direitos individuais. Propôs mais de 800 ações para obrigar o município a oferecer creche, pré-escola, tratamento médico, próteses, aparelhos auditivos e tratamento à toxicodependência para crianças e adolescentes.

Enfim, por essas e outras iniciativas, nossa homenageada de hoje deu uma contribuição marcante para que Santos avançasse nas políticas públicas para a infância e juventude e conquistasse o reconhecimento do UNICEF nesse setor.

Foram quase doze anos de dedicação à Promotoria da Infância e da Juventude em Santos, período em que não esmoreceu diante das dificuldades e não hesitou em partir para o confronto com quem quer que fosse, quando assim entendia necessário, pois estava consciente de seu papel como agente de transformação social.

Atualmente aposentada do Ministério Público, Paula continua sua militância na defesa dos direitos da criança e do adolescente como advogada e cidadã. Sinto-me honrada em representar o Legislativo e a população santista nessa outorga da Medalha de Honra ao Mérito Brás Cubas, porque Paula Trindade soube cumprir seu dever profissional com competência e seriedade. Porém, mais do que isso, atirou-se de corpo e alma na tarefa de preservar a integridade daqueles que representam o nosso futuro.

Muito obrigada,