Câmara homenageia cassados pelo AI-5

Diversas pessoas prestigiaram a homenagem feita aos ex-parlamentares Nelson Fabiano Sobrinho e Marcelo Gato.

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A Câmara Municipal de Santos homenageou na última sexta-feira, dia 17 de março os ex -vereadores e deputados Nelson Fabiano Sobrinho e Marcelo Gato.

 

O ato público relembrou os 30 anos de cassação dos ex-parlamentares pelo AI-5.

 

Durante o evento, o vereador Braz Antunes Mattos Neto (PPS), autor da homenagem, fez o discurso de saudação a Nelson Fabiano Sobrinho e Marcelo Gato.

 

Entre várias autoridades políticas, também marcaram presença no evento, o prefeito João Paulo Tavares Papa (PMDB); os deputados federais Roberto Freire (PPS), Mariângela Duarte (PT) e Alberto Goldman (PSDB); os deputados estaduais Fausto Figueira(PT) e Marcelo Bueno(PTB); o conselheiro da República e ex-senador Almino Afonso; o chefe da Casa Civil do Governo  Estadual, Rubens Lara; e o ex- deputado estadual Edmur Mesquita, representando o governador Geraldo Alckmin.

 

 

Confira o discurso do vereador Braz Antunes Mattos Neto( PPS):

 

 

 

Intervenção.

Cassação.

Perseguição.

Cidade sitiada e silenciada.

Resistência.

Anistia.

Autonomia retomada.

Eleição.

Construção da Democracia.

E agora, o Aperfeiçoamento da Democracia

E o Planejamento do nosso Futuro.

 

 

 

      Em síntese, são estas as palavras que contam a História recente de Santos.

 

      E que oferecem os meios para prepararmos o amanhã.

 

      Os fatos e os acontecimentos estão registrados, impressos e perpetuados.

 

      O que não se registra nem se imprime é o sentimento individual.

 

     

      O que não se mede são as conseqüências para a vida de toda uma população. O que não se conta é que cada um de nós sofreu alguma perda importante, a começar pela ausência da democracia ampla e irrestrita.

 

      A Cidade perdeu muito economicamente, foi praticamente esvaziada. Perdeu lideranças, perdeu artistas, perdeu políticos, perdeu sindicalistas.

 

      Além de tudo isso, a juventude sofreu com a desestruturação do sistema Educacional, operada em todo o País,

com o óbvio objetivo de impedir o espírito crítico, o pensamento contestador e o raciocínio lógico.

     

      O pêndulo do tempo pode até estar dizendo que tudo aconteceu há muito tempo,  lá se vão trinta anos. E que por isso mesmo, tudo deve ser esquecido.

 

      Mas as vozes que aqui serpenteiam  jamais irão admitir que Política de verdade é agente de libertação, e não um instrumento de dominação.

 

      A construção de uma sociedade devidamente informada e formada culturalmente, que deve ser um dos grandes objetivos de todo e qualquer governante, sofreu golpes duríssimos em Santos.

     

      A Cidade foi assim uma espécie de laboratório da repressão. E tudo começou exatamente com a supressão do pleno direito de expressão, da liberdade de opinião. Sob a desculpa de Santos ser considerada área de segurança nacional, em função do seu Porto, resolveram silenciar a Cidade.    

 

      Para os santistas, libertários por natureza e formação, deixar de falar é algo impensável. E muitos continuaram a bradar, pois existem momentos em que a consciência se coloca acima de qualquer ameaça. Justamente na terra de José Bonifácio, o Grande Patriarca da Independência, tentaram calar todo um povo.

     

      Pois entre os que continuaram teimando em falar - e o pior, a denunciar tudo o que achavam que havia de errado -  estavam Nelson Fabiano Sobrinho e Alberto Marcelo Gato. Dois legítimos representantes do que havia de melhor na Política santista. E que de uma hora para outra, sentiram o destino mudar.

 

     

      Sentiram as suas próprias vidas mudarem para sempre.

     

      Sem a política, oficialmente, ambos voltaram-se para o Direito.

 

      Ficar ou partir, eis a questão.

     

      Em um momento difícil, perigoso e até assustador, eles resolveram que, para o bem do povo e das futuras gerações,  aqui ficariam. Não se submeteriam ao exílio, ao auto-exílio.  Exatamente para mostrar que resistir era preciso, mesmo diante dos riscos e das ameaças.

 

      Pois este autêntico exemplo de consciência, de desprendimento e de coragem é exatamente um dos bons motivos para que estejamos realizando hoje este Ato Público. Na minha modesta visão, Ato Público é um instrumento do Poder Legislativo para poder compartilhar conhecimentos pertinentes com a população, para informar e para esclarecer. 

     

      Para quem viveu aqueles tempos nebulosos é hora de dar o seu testemunho sincero. Para os mais jovens, entre os quais me incluo, é hora de aprender que a pior das democracias é preferível à ausência de liberdade. E que devemos estar sempre atentos, para que nunca mais o Estado de Direito seja ferido ou desrespeitado.

 

      E para que nunca mais tanto sofrimento seja imposto ao nosso povo.

 

      Por isso, temos pela frente, hoje, a grande tarefa de buscar o aperfeiçoamento das instituições, dos mecanismos políticos e das instâncias de representação popular. Pois a construção da Democracia é permanente, deve ser renovada a cada momento, a cada novo dia.

 

      Marcelo Gato, deputado federal. Nelson Fabiano, deputado estadual. Cassados no dia 5 de janeiro de 1976. Juntos, foram Vereadores aqui em Santos, ocupando estas mesmas bancadas, esta mesma Tribuna. Fato que por si só é motivo de muito orgulho para todos os atuais Parlamentares desta Casa. Assim como é motivo de  orgulho e honra o elevado nível das autoridades e a altíssima importância das pessoas presentes a este Ato Público. Aliás, gostaria de agradecer de coração a presença de cada um dos senhores e das senhoras.

     

      Hoje, neste exato momento, estamos tendo uma bela aula de História, uma aula de Política e também de Comportamento. Sem falar numa aula magna de fundamentos essenciais de Direito. Para sintetizar, uma aula de Compromisso de Vida.

 

      Devemos agradecer aos Céus a oportunidade de estarmos ouvindo e assistindo a História ao vivo, com o Gato e o Fabiano. Pois muitos desapareceram e outros já não estão conosco.

     

      Seus nomes, porém, devem ser lembrados sempre, como por exemplo Mário Covas, Rubens Paiva, Esmeraldo Tarquínio, João Inácio de Souza, entre tantos outros.

 

      Por isso, devo dizer que sou um felizardo por ter convivido com ambos,  mais intensamente neste último mês, preparando este Ato, mas também nas fileiras do nosso Partido, o PPS.

 

      Mas acima de qualquer outro aspecto, gostaria de falar da nossa Santos.

 

      O grande poeta Roldão Mendes Rosa, que usou a poesia na medida certa para denunciar os desmandos e o arbítrio, escreveu uma vez que a Cidade é a soma das suas faltas e lutas.

 

      Santos foi caracterizada com vários nomes, ao longo da História. Foi chamada de “Barcelona Brasileira”, por seu caráter libertário; de “Cidade do Porto Vermelho”, por sua vocação ideológica; de “Cidade do Silêncio” e “Cidade dos Cassados”, por motivos óbvios, entre outros nomes.

 

      Mas o que precisamos é definir a Cidade que queremos e merecemos. Voltando ao poeta, “a Cidade do futuro não está nos sonhos”: ela está sendo gestada pelas nossas atitudes.

 

      Pessoalmente, gostaria que Santos fosse citada sempre como “a Cidade que Resiste”, que não se cala diante das injustiças e do arbítrio. A Cidade que mesmo debaixo das ameaças ainda vive, ainda pulsa, ainda respira, ainda forja o seu futuro. A Cidade que continua a ensinar ao Brasil o valor da Liberdade e da Caridade.

 

      A Cidade que tem nas palavras, nas idéias e no debate aberto os seus maiores e mais sagrados patrimônios.

 

      Particularmente, tenho uma pequena teoria: o perfil da Cidade vem do exemplo dos seus grandes homens. E temos aqui a figura de José Bonifácio, aquele que arquitetou e consolidou a Independência do Brasil.

 

      Bartolomeu de Gusmão, que elevou aos céus a aventura humana.

 

      Seu irmão, Alexandre de Gusmão, que alargou os horizontes e as fronteiras do nosso País.

 

      E ainda o Visconde de São Leopoldo, José Feliciano Fernandes Pinheiro, o criador da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o primeiro curso jurídico do Brasil, que abriu caminho para um verdadeiro Estado de Direito.

 

      Com esta herança, a alma santista não podia mesmo ser diferente. E é este perfil, que preza a liberdade, a Justiça, a democracia e a aventura, que praticamente nos obriga  a fazer todo o esforço possível para mostrar, a cada instante,  que toda a nossa vida cotidiana depende da Política. Depende das decisões políticas e depende da participação política efetiva.

 

      É por isso mesmo que devemos mostrar às novas e futuras gerações que precisamos construir uma Cidade transparente, de mentes limpas, de ações voltadas para o bem, para a promoção humana.

 

      E mostrar também que quem despreza a Política e os políticos está infelizmente cometendo um verdadeiro suicídio existencial.

 

      Para alcançarmos tudo isso, precisamos nos espelhar nos exemplos vivos de quem não se conforma com as arbitrariedades e com os atentados contra as liberdades individuais.

 

      Exemplos de pessoas como Gato e Fabiano. Que merecem todas as homenagens possíveis tanto no campo político quanto pela essência do comportamento de ambos. Por isso, solicitar este Ato Público representa, para mim, uma honra incomparável e uma preciosa lição de vida.

 

 

      Muito obrigado a todos.

 

 

 

 

      BRAZ ANTUNES MATTOS NETO

            Vereador - PPS.