Audiência Pública do Risco Geológico

Cassandra Maroni participou de evento

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No âmbito do Inquérito Civil aberto pela Promotoria de Justiça do Estado, acerca de Ações de Prevenção e Combate aos Riscos e Danos Decorrentes de Chuvas em Áreas de Risco no Município de Santos, o Ministério Público realizou, nesta sexta-feira, dia 30/4/10, uma audiência pública, com o objetivo de discutir o importante tema e colher subsídios técnicos, administrativos e políticos.

Neste encontro, que ocorreu no Teatro Guarany, a Vereadora Cassandra, que é geóloga, entregou aos Promotores de Urbanismo e Meio Ambiente, Ana Pau la Cruz e Daury de Paula Jr., um documento contendo uma análise aprofundada da política municipal de prevenção e redução de riscos, nos últimos treze anos, período que corresponde às administrações Papa/Mansur.

A Vereadora participou da mesa do evento, composta pelos Promotores, por Regina Elza, da Defesa Civil do Estado, representantes do Corpo de Bombeiros, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, Instituto de Pesquisas Tecnológicas - IPT, Instituto Geológico - IG, além da Defesa Civil e diversos secretários municipais.

Na oportunidade, após apresentação da Defesa Civil municipal, Cassandra apresentou um resumo do documento apresentado, no qual faz uma "radiografia" das fragilidades e problemas da política municipal para o setor, apontando uma série de deficiências que saltam aos olhos de quem observa as encostas da Cidade, com um olhar técnico.

A análise da Vereadora partiu da compreensão de que a prevenção do risco geológico requer planejamento, controle e orientação da ocupação do solo nos morros, articulados à implantação de uma política habitacional para a população de baixa renda e desenvolvimento de um programa de obra s, requisitos que, infelizmente, não são cumpridos no caso de Santos.

Para embasar sua avaliação, Cassandra apresentou fotos aéreas comparando a ocupação de áreas de risco, em diferentes anos, além de documentos que reforçam as fragilidades da política de enfrentamento do risco.

Na Audiência, vários moradores dos morros se manifestaram, em grande maioria, para denunciar o abandono a que estão submetidos, fruto de mais de uma década de desmonte das políticas públicas de prevenção e enfrentamento ao risc o, construídas nos governos do Partido dos Trabalhadores - PT, entre 1989 e 2006, quando Cassandra e sua equipe foram responsáveis pelo setor. Dentre estes testemunhos, destacou-se a fala de Paulo Procópio, morador da Lomba da Penha, que lembrou que, durante as administrações do PT, os técnicos sempre visitavam a área e orientavam os moradores, num diálogo constante, ao contrário do que ocorre atualmente.

Conheça o teor do documento apresentado por Cassandra
ao Ministério Público

     Ref.: Inquérito Civil n° 14.0426.0000099/10-6-MP-PJCS-UMA


CASSANDRA MARONI NUNES, na condição de vereadora à Câmara Municipal de Santos e como geóloga, com atuação em diversos municípios da Baixada Santista, vem, perante essa Douta Promotoria, colocar-se à disposição, para contribuir e fornecer subsídios técnicos, administrativos e políticos, no que concerne ao Inquérito em epígrafe, acerca de Ações de Prevenção e Combate aos Riscos e Danos Decorrentes de Chuvas em Áreas de Risco no Município de Santos.

Neste sentido, aproveito o ensejo para apresentar sucinta análise acerca da condução da política municipal de prevenção e redução do Risco de deslizamento de encostas, em Santos.

Analisando a implementação desta política, nos últimos treze anos, observo uma série de deficiências que saltam aos olhos de quem se dispuser a vistoriar as encostas da Cidade, a partir do entendimento de que algumas das medidas preventivas no enfrentamento do risco geológico dizem respeito ao planejamento, controle e orientação da ocupação do solo nos morros, implantação de uma política habitacional de interesse social e desenvolvimento de um programa de obras e medidas públicas.

De modo geral, é possí vel afirmar que não há controle e orientação da ocupação das encostas. Apenas com o intuito de exemplificar, apresentamos em anexo fotos aéreas de diferentes anos, que atestam a gravidade desta situação, no conjunto de favelas conhecido como Tetéu-Bela Vista-Dr. Chquinho (morros Santa Maria e Caneleira) e Vila Cesar-Vila Menino Jesus (morro Santa Maria e Vila Progresso). Este descontrole é agravado pelo planejamento urbano de natureza segregacionista, em curso no Município, durante o período mencionado.

Observo, ainda, um quadro de extrema lentidão no andamento dos projetos de Regularização Fundiária, nestas áreas de encosta, em que pese a possibilidade de utilização dos instrumentos do Estatuto da Cidade, sancionado há quase uma década. Morros o­ ;nde há a prática insidiosa do "aluguel de chão", como Vila Progresso, Pacheco, José Menino (área da Santa Casa) e Torquato Dias (Morro Nova Cintra), são objetos desses projetos, mas até hoje não tiveram concluídas as negociações entre proprietários e população explorada. De fato, durante este período, nenhum título de propriedade foi entregue aos moradores, gerando profunda insegurança fundiária.

Verifico, também, a lentidão na implementação de uma política municipal de assistência técnica gratuita, para população de baixa renda, em engenharia, arquitetura, geologia e áreas afins, a despeito da sanção da Lei Municipal N° 2.211, de 28 de abril de 2004, e da Lei Federal N° 11.888, de 24 de dezembro de 2008. Até o momento, nenhum projeto de assistência técnica foi implementado na prática. Este entrave é uma das maiores causas que contribuem para a reprodução das situações de risco geológico, num quadro de descontrole da ocupação.

Cabe ressaltar que a população dos morros não vem sendo contemplada em qualquer programa de construção de novas moradias, embora o município já tenha contratado cerca de R$ 98.000.000,00 (noventa e oito milhões de reais) para desenvolvimento de sua política habitacional, na forma de transferências de recursos federais do Programa de Aceleração do Crescimento da H abitação (PAC-Habitação), além de recursos orçamentários próprios, e ainda tenha a possibilidade de implementar convênios com a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (Cdhu). Esta omissão tem sido motivo de justos protestos, por parte de movimento de luta por habitação recém formado, nos morros, que agrupa cerca de 1.200 (mil e duzentos) moradores.

Do ponto de vista das ações essenciais e de alcance imediato, cabe ressaltar a fragilidade da operação do Plano Preventivo de Defesa Civil (PPDC), em Santos. Baseado na possibilidade de adotar medidas preventivas, como retirada das famílias, antecipando-se aos escorregamentos, um dos requisitos do PPDC é contar com abrigo publico provisório e adequado, para receber as famílias em condições adequadas, de forma a construir uma desejável relação de confiança com o Poder Público.

Contudo, a Prefeitura tem estimulado o abrigamento de famílias em casas de parentes e não oferece outra alternativa, o que tem levado a interdições fictícias, com o retorno não monitorado a situações de perigo.

Malgrado o esforço da equipe da Defesa Civil, há uma lacuna técnica, como, por exemplo, a falta de geólogos e profissionais da área social, que impede que a operação do PPDC tenha caráter preventivo. Desta forma, esta equipe tem atuado mais no atendimento emergencial, que na detecção de potenciais ocorrências, como é desejável.

Outro aspecto que contribui para a deficiência da política de controle e redução de riscos é a ausência de estímulo ao efetivo envolvimento da população na definição desta política. Ações importantes, como a formação e estruturação de uma rede de Núcleos de Defesa Civil (NUDEC) são esporádicas e insuficientes.

Observo, ainda, a ausência de reuniões periódicas e sistemáticas com toda a população residente em áreas de risco, o que torna as mudanças de níveis do PPDC atos meramente burocráticos e midiáticos, sem que haja qualquer significância para a população alvo.

No que concerne à administração desta política para os morros, durante o período mencionado, após três alterações da estrutura organizacional da Prefeitura Municipal, conhecidas como Reformas Administrativas, no que tange à ocupação em áreas de risco, observo que esta organização administrativa atual tem caráter negativo. Tendo sido desmontada uma estrutura que possuía autonomia administrativa, orçamentária e financeira, a Administração Regional dos Morros, a unidade foi transformada num departamento que não tem sequer equipamentos para reali zar as intervenções mais prosaicas.

Houve, também, pulverização das tarefas públicas entre varias secretarias, a saber: o planejamento da ocupação e a regularização fundiária estão na Secretaria de Planejamento; o controle da ocupação (fiscalização) está na Secretaria de Infra-estrutura; a execução da política habitacional está a cargo da COHAB Santista; a Defesa Civil encontra-se na Secretaria de Segurança e por fim o referido Departamento está na Secretaria de Serviços Públicos..

No tocante ao Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR), elaborado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), em 2005, com recursos do Ministério das Cidades, cumpre observar que o escopo do Plano, definido pelo Município, não contemplou a totalidade das áreas de ris co existentes à época. Além disso, o PMRR não foi atualizado a cada período chuvoso, como deveria ter sido, tornando o investimento realizado em sua elaboração inócuo. Vários escorregamentos ocorreram em setores de risco previsto no levantamento realizado pelo IPT (PMRR/2005), sem que as intervenções de curto ou médio prazo indicadas tivessem sido realizadas. Para ilustrar, cito três exemplos recentes:

§         Desplacamento rochoso na Rua Projetada, continuação da Rua Godofredo Fraga, no Morro José Menino (referenciado no PMRR como Morro Santa Terezinha, Setor 16 - Risco 3 - nível alto);

§          Queda de bloco rochoso, na Rua Alberto Veiga, Morro do Marapé (referenciado no PMRR como Setor 6 - Risco 3 - nível alto);

§          Escorregamento de solo e rocha na Rua Visconde do Embaré, Morro Boa Vista (referenciado no PMRR como Setor 13 - Risco 4 - nível muito alto).

Na verdade, o PMRR nunca foi utilizado como diretriz das intervenções com foco na promoção de segurança do habitat nos morros, ao longo desses cinco anos, o que deveria ser sua função principal.

No que respeita às obras realizadas pela Prefeitura, em áreas de encostas, enquanto o projeto denominado Santos Novos Tempos não se torna realidade, a Municipalidade nada faz acerca das obras anunciadas no âmbito deste projeto. Por outro lado, a Prefeitura tem contratado empresas para executar muros de arrimo e de contenção, em desacordo com a hie rarquização de intervenções apontadas pelo PMRR e sem justificativas técnicas claras de priorização ou de definições de natureza urbanística indicadas anteriormente, que visem à consolidação da ocupação. Desta forma, estes investimentos acabam por serem canalizados para obras, que nem sempre se destinam à fixação da população, sem a devida avaliação técnica.

Destaca-se como fator positivo a sanção da Lei Municipal N° 573, de 14 de junho de 2006, que "autoriza o Poder Executivo a prover de supervisão técnica e/ou custear as despesas de obras e medidas de correções de situações de risco geo lógico", regulamentada pelo Decreto N° 4.673, de 3 de outubro de 2006. Entretanto, por ocasião da apresentação do Requerimento N° 1.844, de maio de 2007, aprovado pela Câmara Municipal e enviado ao Sr. Prefeito, solicitando "informações acerca de obras e medidas de correções de situações de risco geológico", obtive resposta, por meio do Ofício N° 268/2007-GP/CM-DEALE, do Chefe do Executivo, através do qual é informado não haver obras em andamento.

Por fim, ressalto que hoje está disponível abundante conhecimento acerca de experiências exitosas na área de controle e redução de riscos geológicos, além de disponibilidade de recursos para planejamento e obras, que tornam as prefeituras capazes de impedir ou minimizar danos e perdas de vidas humanas. Nada justifica, portanto, a atual inércia e inépcia da Prefeitura Municipal de Santos, na prevenção e no enfrentamento do risco geológico nos morros.

Sendo assim, coloco-me à disposição para quaisquer outros esclarecimentos e manifesto protestos de elevada estima,

Cassandra Maroni Nunes
Vereadora da Câmara Municipal de Santos e Geóloga