Muita calma nessa hora

Artigo publicado em A Tribuna

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Desde a década de 90, o Brasil tem passado por enormes transformações em sua economia. Uma das mais significativas diz respeito ao processo de privatizações de suas empresas estatais de responsabilidade do governo, chamado de desestatização da economia, que mudou por completo o papel do Estado no país. As possíveis privatizações de portos e aeroportos brasileiros, assunto cada dia mais em pauta tanto na imprensa quanto no meio político, são um tema polêmico, pois podem trazer sérios e irreversíveis prejuízos ao nosso país. Isso porque, as privatizações, historicamente, não nos têm rendidos bons frutos.

Para quem não se recorda ou para quem não viveu essas mudanças político-econômicas, a política neoliberal, implantada pela ministra Zélia Cardoso de Mello, do então presidente Fernando Collor de Melo, foi o pontapé inicial para a avalanche catastrófica de privatizações no Brasil. Empresas siderúrgicas, do ramo da aviação, minérios, ferrovias, bancos, energia elétrica e telecomunicações foram algumas das sucessivas desestatizações realizadas posteriormente, pelo governo FHC. Dando continuidade, o governo Lula tratou de privatizar milhares de quilômetros de nossas estradas, concedendo ao grupo espanhol OHL o direito de explorar por 25 anos inúmeras rodovias, hoje repletas de pedágios, por todo o país.

Não é preciso fazer muito esforço para lembrar alguns dos serviços de má qualidade e a preços abusivos que recebemos hoje, sem que tenhamos outra opção, oriundos dos processos de privatização. Embratel e Telebrás, nas telecomunicações; Eletropaulo, na energia elétrica; são alguns deles. Sem falar nos indícios de benefícios a grandes grupos privados e nos casos das vendas com financiamentos do BNDES recursos obtidos a juros subsidiados do próprio governo, que vendia suas empresas concedendo financiamentos do BNDES e dos fundos de pensão.

Para regulamentar e fiscalizar os serviços públicos prestados pelas empresas privatizadas, foram criadas as Agências Reguladoras, Anatel, Anac, Aneel, Antaq, entre outras, todas ligadas à estrutura do Governo Federal. Mas a verdade é que todas deixam a desejar e efetivamente não desempenham o papel a que foram propostas, já que não defendem os usuários dos serviços e estes permanecem, então, escravos dessas empresas, já que não há concorrência.

A venda de todas essas estatais não impediu o endividamento do país, sendo então o seu principal objetivo não alcançado. Diante desse panorama, a pergunta é: porque seguir o modelo fracassado e persistir no erro e privatizar portos e aeroportos? A regulamentação da concessão para exploração dos portos brasileiros por capital estrangeiro e da criação de novos portos privados, bem como a questão da privatização dos aeroportos, tem sido nos colocado goela abaixo. Esses processos devem acontecer mediante estudos, planejamento, cálculos de riscos, consulta da opinião pública, e não simplesmente porque o governo não consegue mais gerenciar esses serviços.

É preciso ter muita calma nessa hora, pois a questão vai além, e não está apenas em ser contra ou a favor dos programas de privatizações, mas sim em conhecer a lógica do mercado, o conteúdo desses programas e a forma com que as vendas são feitas, e os serviços posteriormente fiscalizados pelas agências reguladoras, pois as falhas e a falta de planejamento desses programas colocam por terra suas reais funções, fazendo das privatizações apenas uma venda sumária, e muitas vezes a preço de banana, do patrimônio brasileiro construído com o dinheiro público.

Infelizmente, o que vemos hoje é um panorama nada animador. Nossos portos e aeroportos sendo vendidos a toque de caixa. E o resultado todos nós já conhecemos: população descontente e serviços de má qualidade.

*Marcus De Rosis é vice-líder do Governo na Câmara de Santos e vereador pelo PMDB