Dr. Thomas Maack: homenagem relembra história do navio Raul Soares

Marcus de Rosis entregou placa ao médico preso político

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“Esta noite é uma daquelas que podemos qualificar como histórica. Uma noite em que teremos que mexer em ferimentos já cicatrizados e isto pode doer na alma daqueles que sofreram as torturas nos cárceres da ditadura militar”. Assim, o Líder do Governo, vereador Marcus De Rosis, iniciou sua fala na última quinta-feira, dia 8 de novembro, dando um tom de emoção ao que deveria ser apenas mais uma sessão ordinária, mas que teve caráter solene naquela noite.

Isso porque, a Câmara de Santos recebeu nesta data, o médico, professor, cientista e pesquisador, Thomas Maack. Preso político do navio-prisão Raul Soares (atracado nas proximidades da Ilha Barnabé entre abril e outubro de 1964, durante a Ditadura Militar) o médico esteve no Legislativo Santista juntamente com sua esposa Isa Maack, para receber das mãos do vereador Marcus De Rosis, homenagem em forma de placa.

Para o vereador, “as asas do destino que o levaram para tão longe do Brasil, são as mesmas que o trazem esta noite de volta a esta cidade, a terra da caridade e da liberdade, para que possamos agradecer-lhe e render-lhe esta homenagem. Vemos nas galerias os sindicalistas que também vieram para abraçá-lo e agradecê-lo”.

Dr. Thomas iniciou seu discurso com agradecimentos. “Considero esta uma homenagem coletiva a todos os prisioneiros do Raul Soares e suas famílias. Quero agradecer ao vereador Marcus De Rosis, ao presidente Manoel Constantino, extensivo a todos os vereadores. A decisão desta Câmara, de interromper seus trabalhos para essa cerimônia, mostra o alto grau de consciência de que lembrar o passado permite também compreender as tarefas do futuro”.

Lembrando a triste memória da história do navio Raul Soares, escrita por torturas e opressão aos sindicalistas de nossa cidade, o médico emocionou-se - e também emocionou muitos dos ali presentes – ao relembrar os meses em que foi obrigado a viver confinado em alto mar, antes de fugir e exilar-se em Nova Iorque, onde construiu sólida carreira na área médica. “Se a ditadura falhou em quebrar a minha resistência, é por causa do apoio e sustento dos meus companheiros de prisão, principalmente os sindicalistas de Santos”.

O especialista nasceu na Alemanha e veio para o Brasil com poucos meses de vida, com os pais refugiados do regime militar. Formou-se em medicina pela Faculdade de Medicina da USP e aqui viveu até os 29 anos, quando foi forçado a sair do país. Um dos cerca de 150 presos políticos do navio-prisão Raul Soares, Dr. Maack atendia os colegas sindicalistas capturados pelo Regime Militar durante o período de cárcere. “Enquanto eu exercia a atividade médica, os meus companheiros prisioneiros me curavam emocionalmente”.

Para finalizar seu discurso, Dr. Thomas destacou a importância da investigação da história do navio Raul Soares pela Comissão Nacional da Verdade. “Nós queremos saber a verdade. Quem mandou o navio-prisão Raul Soares para Santos? Qual foi a linha de comando? Porque é sabendo a verdade que se evita não só as Ditaduras futuras, mas também a ruptura de princípios democráticos dentro de sistemas como nós temos presentemente”.

No início deste mês, o vereador Marcus De Rosis apresentou requerimento, fundamentado na série de reportagens do Jornal Diário do Litoral, intitulada ‘Democraria à Deriva’, enviando ofício ao Governo Federal, solicitando à Comissão Nacional da Verdade – órgão que apura graves violações de Direitos Humanos praticados durante a Ditadura Militar – que investigue as torturas e violências praticadas dentro do navio-prisão Raul Soares.

 

            DISCURSO HOMENAGEM AO MÉDICO THOMAS MAACK

Esta noite é uma daquelas que podemos qualificar como histórica. Não é apenas uma noite de uma merecida homenagem. Mas, uma noite que resgata parte da história de nossa cidade, relembra um período difícil dessa mesma história para o sindicalismo.

Trata-se de uma noite de homenagens a um personagem bastante querido desta mesma história. Mas, também é uma noite em que teremos que mexer em ferimentos já cicatrizados e isto pode doer na alma daqueles que sofreram as torturas nos cárceres da ditadura militar.

Neste plenário, em nossa frente, para receber aplausos de todos os senhores e senhoras está o médico, professor, cientista e pesquisador Thomas Maack. Um personagem e também vítima dessa história escrita com torturas dentro do Navio-Prisão Raul Soares, de triste memória para todos nós.

Um homem sério e honrado e hoje um profissional famoso internacionalmente, mas que, como tantos outros inocentes, foi perseguido e preso pela ditadura militar sem ter cometido crime algum. E foi trancafiado no navio Raul Soares, ancorado aqui em nosso porto, no ano de 1964. E o pior: teve que fugir do País e se exilar nos Estados Unidos, deixando para trás sonhos e uma vida destruída.

Preso pela Ditadura Militar, ficou confinado no navio-prisão Raul Soares por quatro meses, de junho a outubro de 1964. Entretanto, o presídio flutuante não tinha médico e coube a ele, mesmo na condição de preso político, fazer atendimentos aos presos. E nessa condição, ajudou a salvar vidas de sindicalistas e de outros prisioneiros, que doentes eram socorridos pelo médico, retirados dos calabouços do navio-prisão e encaminhados aos hospitais da região.

Durante muitos anos ele foi considerado um mito ou uma lenda nos fatos narrados por presos do navio Raul Soares. A figura do jovem médico de cabelos de fogo, que também era um dos presos, foi sempre relatada e lembrada com gratidão por presos políticos e sindicalistas que ficaram confinados no presídio flutuante. Mas, ninguém sabia seu paradeiro, qual teria sido seu destino após a desativação do navio ou mesmo se estava vivo.

Pois bem, este personagem e também uma das vítimas desse triste capítulo do sindicalismo de Santos está de volta a Santos. Está aqui neste plenário. Veio de Nova Iorque, nos Estados Unidos, País para onde a vida o levou em busca de exílio político. Hoje, ele é cidadão americano, médico, professor universitário e um dos maiores especialistas em pesquisas médicas do mundo. Tinha 29 anos de idade quando teve que fugir do Brasil e hoje está com 77 anos. Formou-se médico no Brasil, na USP, é casado com a brasileira Isa, que o acompanha neste plenário.

As asas do destino que o levaram para tão longe do Brasil, são as mesmas que o trazem esta noite de volta a esta cidade, a terra da caridade e da liberdade, para que possamos agradecer-lhe e render-lhe esta homenagem. Vemos nas galerias os sindicalistas que também vieram para abraçá-lo e agradecê-lo.

É com grande orgulho podermos, após quase cinco décadas, resgatar uma parte dessa dívida de nossa cidade com o Dr. Thomas Maack. Em nome de todos os vereadores desta Câmara e do presidente Manoel Constantino, saudamos e cumprimentamos o nosso homenageado e num só coro dizemos: muito obrigado.