Garantir moradia individualizada para a população em situação de rua e suporte adequado gera bons resultados e pode representar redução dos investimentos em outros serviços de assistência social e de saúde, segundo dados demonstrados durante audiência pública realizada (25) na Câmara de Santos sobre o Projeto Moradia Primeiro (Housing First).
O debate conduzido pelo vereador Cacá Teixeira (PSDB), presidente da Comissão Permanente de Assistência Social, contou com a participação do coordenador-geral da População em Situação de Risco, do Governo Federal, Carlos Alberto Ricardo Júnior. Foi ele quem apresentou informações de vários países que já contam com o Moradia Primeiro.
No Brasil, o trabalho adotado para a população em situação de rua coloca como última etapa a moradia. O Projeto Moradia Primeiro inverte esse processo. A moradia permanente e individualizada é ponto de partida e não a última etapa da intervenção.
Segundo o representante do Governo Federal, a pessoa em situação de rua acaba transitando entre os diversos serviços e não tem referência de moradia. Por causa disso não consegue acessar um trabalho, por exemplo. “O Moradia Primeiro é mais barato que os serviços tradicionais que temos hoje”, destaca Carlos. Além disso, cerca de 80% a 95% das pessoas que ingressaram em projetos de Housing First permanecem na moradia após dois anos.
Um dos maiores desafios para implantar o Housing First é assegurar a sustentabilidade financeira do projeto. Por enquanto o Brasil tem dois projetos de Moradia Primeiro. Em Curitiba, o modelo é adotado há 3 anos, mas não conta com recursos públicos. A outra cidade que já executa a proposta é Porto Alegre. Nos dois municípios os resultados são positivos, segundo Carlos. Há outras cidades com projetos em elaboração.
Para o vereador Cacá Teixeira, o resultado que se espera da política pública para a população em situação de rua é a superação dessa situação. Por isso, “nós precisamos investir e ter vontade política para avançarmos”.
Alerta
Censo da população de rua de Santos realizado em 2013 apontou 797 pessoas nesta situação, sendo 26% em abrigos. O último levantamento, em 2019, registrou 868 pessoas. No entanto, apenas 12% dessa população estava em abrigos.
“Essa baixa da procura de vagas está dizendo que o nosso trabalho não está atendendo efetivamente o que a política nos diz”, explica a servidora da Secretaria de Desenvolvimento e membro do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), Marilda da Paixão Isaias dos Santos. Para ela, apesar do relatório ser preliminar já representa um alerta.
Professora da Unifesp, Luciana Togni de Lima e Silva Surjus que também participou do debate, acredita que o problema não é falta de recursos para lidar com a questão da população em situação de rua, e sim a distribuição desse recurso. “Nós não podemos combater a população em situação de rua. O que temos que combater é a desigualdade”.
Depoimentos
A audiência pública contou ainda com a participação de duas pessoas que já viveram em situação de rua. Décio Mardegam contou que desde que passou a receber um salário mínimo pelo Benefício de Prestação Continuada, conseguiu se estabilizar. Com o recurso ele aluga um quarto. “Fiquei 5, 6 anos na rua por falta de emprego. Era usuário abusivo de álcool e drogas. Inclusive as drogas médicas legais. Parei. Parei totalmente. Não uso, não preciso. Então tem esse grande auxílio que a questão da casa nos oferece”.
Laura Dias contou que usou crack por 20 anos e viveu em situação de rua. Quando voltou para a casa da mãe, teve forças para, aos poucos, se reestruturar. “A partir do momento que você tem um teto, que você tem uma casa, você começa novamente a se reconhecer como ser humano”.
Participantes
Também participaram da audiência pública, a vereadora Débora Camilo (PSOL), o presidente do CMAS, Rodrigo Salvador Lachi e Miriam Araujo, da Secretaria de Desenvolvimento Social.