Presidente Quintino de Lacerda 1895

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Quintino de Lacerda

Nascido escravo na Província de Sergipe, em 8 de junho de 1839, Quintino de Lacerda foi o primeiro líder político negro de Santos. Trabalhou como cozinheiro de Antônio Lacerda Franco e na firma Lacerda & Irmãos. Sendo este abolicionista, libertou o escravo que, reconhecido, tomou-lhe o nome, segundo antigo costume romano, passando a chamar-se Quintino de Lacerda – era, entretanto, mais conhecido por Tintino.

O mais atuante agitador da abolição da escravatura do litoral paulista, Quintino foi chefe do Quilombo do Jabaquara, onde abrigava escravos fugitivos de toda a região e do planalto, que aqui buscavam refúgio. De acordo com historiadores, o quilombo era inexpugnável, defendido pela encosta do Morro do Jabaquara e com um único acesso, permanentemente guardado por sentinelas de Quintino.

Em 1850, havia 3.189 escravos em Santos, para uma população livre de 3.956 habitantes. Quinze anos depois já existia uma forte resistência organizada. Tanto que, três meses antes da abolição, já não havia mais escravos em Santos. No dia 13 de maio de 1888, data em que a Princesa Izabel assinou a Lei Áurea, teve início grande festa popular, com comícios, passeatas, música e dança nas ruas, que durou oito dias. Quintino de Lacerda foi o centro das atenções e chegou a receber das mãos de Martim Francisco Sobrinho, em solenidade pública, um relógio de ouro, homenagem popular ao mais querido líder abolicionista de Santos e região.O relógio contava com a seguinte inscrição, de acordo com o historiador Francisco Martim dos Santos, em sua obra História de Santos: “Lei de 13 de maio de 1888. Homenagem popular abolicionista a Quintino de Lacerda, Santos, 1888”.

Impulsionado pela abolição, Quintino lança-se à polícia, agregando os negros, pela primeira vez na história de Santos, ao processo político. Organizou e comandou um batalhão na defesa contra uma suposta rebelião para depor o Marechal Floriano Peixoto, o que lhe rendeu o título de Major Honorário da Guarda Nacional, em 1893.

Sua eleição como vereador, em 1895, desencadeou uma grande crise política fomentada por setores racistas da Cidade, iniciada com a negação de sua posse, pelo fato de Quintino ser analfabeto. Começou então uma batalha judicial que chegou aos tribunais paulistanos e terminou com a vitória de Quintino.

Prevendo o resultado favorável ao líder abolicionista, o presidente da Câmara, Manoel Mário Tourinho, renunciou ao mandato, seguido pelos vereadores Alberto Veiga e Sacramento Macuco. Coube ao novo presidente, José André do Sacramento, dar posse ao vereador, garantida graças a um Acórdão do Tribunal de São Paulo. Mas Sacramento  também renunciou ao mandato, declarando-se “enojado” com o que via, conforme registra a obra de Francisco Martins dos Santos.

O historiador destaca ainda que apenas um dos inimigos de Quintino permaneceu na Câmara, embora não mais comparecesse às sessões – Olímpio Lima, diretor do jornal ‘A Tribuna do Povo’, hoje ‘A Tribuna’.

As atividades da Câmara foram suspensas até 1º de junho, quando voltou a funcionar, agora sob a presidência interina do próprio Quintino. No dia 9, os cargos vagos são preenchidos e, sete dias depois, devido às ausências em plenário, sem justificativa, e cumprindo a Lei Eleitoral, Quintino propõe – e obtém, por unanimidade – a cassação de Lima.

Inconformado, o jornalista voltou à Câmara em 12 de julho, assim que foi empossado o novo presidente, Antônio Vieira de Figueiredo, mas foi solicitado a retirar-se, pois seu mandato fora cassado. Utilizando-se de seu jornal, Lima inicia uma violenta série de ataques contra Quintino e contra a própria Câmara, que culminou com a revogação da Constituição Municipal autônoma, votada em 15 de novembro de 1894 e durou menos de um ano.

A facção da Câmara que insistentemente tentou impedir Quintino de representar a população negra foi enfrentada pelo vereador, que inúmeras vezes recorreu à Justiça. Embora analfabeto, ele conhecia a lei suficientemente para defender seus direitos. Várias vezes adentrou à Sala das Sessões, na antiga Casa de Câmara e Cadeia, reagindo contra as provocações e tentativas de humilhá-lo.

Quintino de Lacerda morreu em 10 de agosto de 1898, deixando três filhos. Seu enterro foi acompanhado por um expressivo número de pessoas, testemunho do reconhecimento de sua importância histórica.