A utilização dos recursos de mídia e dos processos da comunicação de massa na educação é capaz de gerar grandes transformações no aprendizado, dentro e fora da sala de aula. Dessa prática pedagógica surgiu o conceito de educomunicação, que há décadas produz experiências bem-sucedidas no Brasil e no exterior.
Para subsidiar o debate sobre a implantação da educomunicação nas escolas de Santos, a Câmara Municipal realizou audiência pública na segunda-feira, 28 de abril.
A ideia surgiu de um projeto apresentado no ano passado na Câmara Jovem pela então jovem vereadora Karolyne Fernandes de Lira, que também participou da audiência. Integrante do Projeto Memórias em Rede, do Instituto Devir Educom, Karolyne propôs estender a iniciativa para toda a rede municipal de ensino. A proposta foi encampada pela vereadora Renata Bravo (PSD), que elaborou projeto de lei nesse sentido, levou a ideia à secretária municipal de Educação, Audrey Kleys, e convocou a audiência.
Senso crítico
A educomunicação se desenvolveu na América Latina a partir dos anos 50, articulando práticas que depois foram sistematizadas pelo educador Paulo Freire, num contexto de mobilização pela democracia e pelo aumento da participação popular.
Foi o que explicou na audiência o professor Ismar de Oliveira Soares, precursor da educomunicação no Brasil. Jornalista e doutor em comunicação pela ECA/USP, Ismar fundou na mesma universidade o Núcleo de Comunicação e Educação.
O tipo de aprendizagem praticado na educomunicação tem como pressuposto a autonomia dos alunos e a construção de relações horizontais. O processo desenvolve o senso crítico em relação aos fatos e aos meios de comunicação, contribuindo até para afastar a influência das fake news. A partir disso, os estudantes produzem reportagens, podcasts, blogues, documentários, jornais, sites e outros produtos de mídia, sobre os mais variados temas.
"Isso pode acontecer com um pequeno grupo de pessoas em algumas cidades do Brasil, numa política pública de uma cidade como São Paulo ou no país inteiro", explicou Ismar, que também preside a Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais em Educomunicação (ABPEducom).
Na cidade de São Paulo, a iniciativa começou com um projeto de rádio em uma escola municipal como forma de reduzir a violência entre os alunos. Vinte anos depois, o município já formou em toda a rede cerca de 45 mil alunos e mil professores em educomunicação. "Passaram sete ou oito prefeitos e uns 15 secretários de educação; o projeto ganhou um prêmio da Unesco", contou Ismar.
Educação midiática
Em Santos, a educomunicação é a base do Projeto Memórias em Rede, do Instituto Devir Educom, que realiza oficinas jornalísticas em algumas escolas municipais. Projetos de lei para transformar essa prática em política pública já foram apresentados em 2021 e 2022, mas acabaram não se concretizando, conforme apontou Sandra Santos, assessora do vereador Cacá Teixeira (PSDB).
Por outro lado, a Prefeitura estuda a implantação de um projeto chamado Parquinho Tecnológico. Segundo Cristiane Domingues, chefe do Núcleo Tecnológico Educacional da Secretaria Municipal de Educação, o Projeto inclui oficinas de educação midiática.
Uma das preocupações é a formação dos professores e dos gestores escolares na nova prática educacional. Outra questão é a forma como a educomunicação pode entrar no currículo. "Temos de tomar cuidado para o tema não perder a força quando utilizado como tema transversal", disse Débora Marreiro, diretora do Departamento de Formação.
"A criação de uma política pública possibilitaria reforçar práticas que já vêm sendo desenvolvidas e permitir que outros setores sejam beneficiados", afirmou a vereadora Renata Bravo.
Também participaram da audiência representantes de vários órgãos municipais, de vereadores e do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente; além dos presidentes do Conselho Municipal da Juventude, Lucas Oliveira da Silva; da OSC Concidadania, Marise Cabral, e do Instituto Devir Educom, Andressa Luzirão.